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sexta-feira, 23 de março de 2012

Conselho de Psicologia questiona as 'comunidades terapêuticas'

Nos últimos meses, o crack ocupou as páginas dos principais jornais do país, assim como as notícias das ações, algumas bastante polêmicas, realizadas pelos governantes para combater o uso da droga, como a internação compulsória de usuários do crack e as ações policiais nas chamadas ‘cracolândias'. Com os holofotes da imprensa sobre o assunto, no final de 2012, o Ministério da Saúde lançou o Plano Integrado de Enfrentamento ao Crack e Outras Drogas, com o slogan 'Crack, é Possível Vencer'. Bem antes do lançamento do plano, já no discurso de posse, a presidente Dilma prometeu que esta seria uma das prioridades de sua gestão. O 'Crack, é Possível Vencer' prevê medidas em três eixos de atuação - cuidado, autoridade e prevenção - e mantém a possibilidade de convênio com as chamadas comunidades terapêuticas, um dos pontos mais criticados do programa.

Segundo o Ministério da Saúde (MS), o plano investirá R$ 4 bilhões no "enfrentamento" à droga. No eixo cuidado, está prevista a reformulação da 'Rede Conte com a Gente', que inclui estruturas já existentes e outras novas para atender aos usuários, como as enfermarias especializadas dentro de hospitais públicos. Também serão criadas Unidades de Acolhimento, que, segundo o MS, funcionarão como moradias temporárias nas quais os usuários de crack receberão cuidados clínicos. Além disso, serão potencializados os já existentes 'consultórios de rua' - equipes multiprofissionais que abordam usuários de drogas nos locais de consumo - e os Centros de Atenção Psicossocial especializados em usuários de Álcool e Drogas (Caps AD). De acordo com o Ministério da Saúde, as comunidades terapêuticas, coordenadas por entidades sem fins lucrativos, também poderão fazer parte da 'Rede Conte com a Gente'.
O reconhecimento dessas instituições como possíveis espaços de tratamento aos usuários de crack foi o que gerou mais críticas ao plano. O papel de recuperação e cuidado que as chamadas comunidades terapêuticas e outras instituições de internação cumprem para os usuários não apenas de crack, mas também de outras drogas, é bastante controverso. Pouco antes do lançamento oficial do programa, o Conselho Federal de Psicologia (CFP) entregou ao Ministério da Saúde o Relatório da "4ª Inspeção Nacional de Direitos Humanos: locais de internação para usuários de drogas" (leia aqui) contendo várias denúncias de irregularidades encontradas pelo Conselho em alguns desses espaços, como utilização de mão de obra não remunerada, preconceito por orientação sexual e religiosa, violação de privacidade, torturas psicológicas, falta de acesso a atendimento médico e à rede de educação.
Inspeções
A Comissão de Direitos Humanos do CFP inspecionou 68 unidades em 24 estados e no Distrito Federal. O relatório foi entregue ao Ministério da Saúde e ao Ministério Público, e também apresentado na 14ª Conferência Nacional de Saúde, que aprovou uma moção de repúdio ao financiamento do governo federal à comunidades terapêuticas. Por meio de sua assessoria de imprensa, o Ministério da Saúde confirmou que o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, recebeu o relatório em audiência com representantes do CFP. Questionado sobre que providências foram tomadas em relação às denúncias, o Ministério reforçou que as instituições denunciadas no relatório não recebem recursos do Sistema Único de Saúde (SUS) e respondeu apenas que "quem fiscaliza [as comunidades terapêuticas] são as unidades das vigilâncias sanitárias locais, de acordo com os critérios estabelecidos pela Anvisa". Sobre os critérios para que instituições desse tipo sejam conveniadas ao SUS, a assessoria disse que "a partir do novo programa 'Crack, é Possível Vencer', elas terão que aderir ao plano por meio de projetos que precisam atender às exigências técnicas necessárias".
O professor-pesquisador da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio/Fiocruz, Marco Aurélio Soares, explica que as chamadas comunidades terapêuticas que existem atualmente, a maior parte delas criadas por entidades religiosas, não têm nenhuma relação com o conceito original. "O que existe no Brasil nem se aproxima da ideia verdadeira de comunidades terapêuticas, que foram pensadas pelo psiquiatra inglês Maxwell Jones como espaços democráticos, onde as pessoas ficam se quiserem, participam de assembléias, etc", observa Marco Aurélio, que também coordena na EPSJV/Fiocruz o Curso de Atualização Profissional em Atenção ao uso prejudicial de Álcool e outras Drogas, destinado a profissionais de saúde.
Drogas como uma questão de saúde pública
O coordenador de Saúde Mental do Ministério da Saúde, Roberto Tykanori, explica a partir de quais diretrizes a política de enfrentamento ao crack do governo federal está sendo criada. "Como se trata hoje de um tema bastante polêmico, é fundamental, do ponto de vista ético-político, nos atermos àquilo que a Constituição nos garante. O artigo 5º é uma referência fundamental no que tange a qualquer ação na área da educação, da saúde, da justiça ou da polícia. Em situações polêmicas ou extremadas, há uma tendência a querer suprimir ou fazer vista grossa em relação à garantia dos direitos individuais", diz. Tykanori acrescenta que do ponto de vista técnico, o Ministério fez uma projeção do tamanho do problema com o crack, embora existam poucas informações já disponíveis. "As informações que temos não são muito consistentes, então, trabalhamos com números projetados, estatísticas de outros países e dados da Organização Mundial da Saúde (OMS). O princípio orientador da política de crack é que as pessoas vão depender de vários tipos de abordagem dependendo da situação como se encontram, então, adequaremos a oferta à variedade de necessidades. Esse principio é o que organiza hoje a rede de atenção aos usuários de crack e outras drogas", complementa.


Fonte: Revista Caros Amigos 

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