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Centro de Referência Técnica em Psicologia e Política Pública (CREPOP) do Conselho Federal de Psicologia (CFP) realizou na manhã desta quarta-feira (23/05) debate online sobre atuação do psicólogo no Centro de Atenção Psicossocial (CAPs). O evento foi moderado pela conselheira do CFP Heloiza Massanaro e contou com a participação da psicóloga Elisa Zaneratto Rosa. A transmissão alcançou mais de dois mil pontos conectados e foram recebidas mais de 50 perguntas de internautas que acompanharam a discussão via internet e também pelo
twitter por meio da hashtag
#DebateOnlineCFP.
A convidada Elisa Zaneratto Rosa é psicóloga, formada pela Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo, tem mestrado em Psicologia Social e é professora assistente na mesma universidade. Atualmente é doutoranda em Psicologia Social. Zaneratto iniciou o debate traçando histórico da luta antimanicomial no Brasil, que em 2012 completa 25 anos. Segundo a psicóloga, a diretriz do movimento social reivindicava transformações no campo das políticas públicas. “Inicia-se no Brasil um processo de redefinição, reforma e transformação de políticas públicas em relação à saúde mental” explica.
Para Zaneratto, o grande desafio desse novo modelo de atenção à saúde é a substituição das formas tradicionais de trabalho e sua relação com a loucura, com o controle dos sujeitos. “Existe a necessidade de substituição, que trabalhe com sujeitos em liberdade e resgate a condição de anulação no qual foram colocados para trazê-los de volta à cidadania” aponta. A psicóloga explica que os CAPs e uma rede de serviços estratégicos devem substituir os hospitais psiquiátricos.
Segundo Zaneratto, nos CAPS são oferecidos cuidados intensivos, acolhimento, projetos terapêuticos ímpares que respondem à singularidade que cada caso requer. “Esses novos projetos representam a possibilidade de exercício de cidadania” explica. Para ela, existe um grande investimento em CAPs no Brasil. De 1987 até 2012 foram abertos 1742 CAPs, conforme a última publicação do Ministério da Saúde.
Desta parte do debate até o final, a conselheira Heloiza Massanaro trouxe as participações dos internautas, lendo perguntas enviadas por email. A primeira questionou “porque não bastava humanizar o manicômio?” Zaneratto apontou que uma das diretrizes da luta antimanicomial é que manicômio não se humaniza, pois o tratamento é baseado na cura de uma doença. Para a psicóloga, a análise e a leitura de toda história da loucura, como doença mental, legitima um tratamento moral. “O que deveria existir e lutamos para que exista é uma perspectiva de cuidado que se comprometa com a possibilidade de produção de novos projetos de vida e de outras trajetórias, nas quais a pessoa possa superar a convicção de sofrimento com seu transtorno mental”, completa.
Outro internauta apontou formas de atuação do psicólogo em novos espaços. Segundo Zaneratto, um grande desafio dos psicólogos é o paradigma da doença e da loucura como doença. “O que existe hoje é a perspectiva de pensar a saúde como ausência de doença. O desafio é superar essa perspectiva e colocar outra no lugar”, aponta. Para ela, a Psicologia vem fortalecer um campo de conhecimentos que responde às necessidades atuais. “A Psicologia está presente na escola, no campo do trabalho, não só na saúde mental, mas em outros campos e isso exige um reposicionamento”. Zaneratto dá exemplos desse novo posicionamento com a institucionalização do Sistema Único de Saúde (SUS), em 1988, que trouxe uma nova perspectiva de trabalho e sobre o que é saúde. Ela ainda cita como exemplo o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que também reorienta a perspectiva de atenção a infância e adolescência. “Os novos marcos legais desse momento apontam características de políticas públicas, onde os psicólogos que se inserem no SUS precisam de outras referências que respondam a esse modelo de atenção à saúde. Já não dá mais para fazer a Psicologia do ajustamento, a gente precisa produzir referências que respondam a essa nova perspectiva e isso exige novos marcos teóricos e técnicos” explica Zaneratto.
A conselheira do CFP Heloiza Massanaro aponta, como parte desse processo, a criação do CREPOP, que teve origem no Banco Social de Serviços, por volta de 2003. “Em 2006 surge o CREPOP para saber o que os psicólogos estão fazendo nas políticas públicas e em 2007 já surgem pesquisas”, explica.
Zaneratto aponta que a produção do documento de referência dos CAPS serve também para que o psicólogo atue em outros pontos da rede substitutiva de saúde mental. “Isso que temos nos CAPs dá pra aplicar em outros pontos das redes, Núcleos de Atenção, Centros de Convivência e Cultura, Residências Terapêuticas”, explica. Segundo a psicóloga, o documento pode ser interessante não só para o diálogo entre psicólogos que trabalham nos CAPs, mas com todos os trabalhadores de um CAPs. “Na verdade, uma das prerrogativas orientadoras da perspectiva de atenção psicossocial é a prática multiprofissional, que é mais do que a soma de saberes. O usuário do serviço participa da construção do seu projeto terapêutico e também do serviço onde é atendido. Todos trazem leituras diferentes para pensar e propor estratégias de cuidado”, explica.
A psicóloga Zaneratto aponta a necessidade do movimento social em fazer frente a hegemonia do saber. “A necessidade de pensar e construir estratégias que articulem redes intersetoriais já quebra a hegemonia do saber médico, não derrubada dentro dos serviços de saúde.” Para ela, é necessário quebrar esse paradigma do ponto de vista técnico, científico, cultural e social. A psicóloga aponta como exemplo a Marcha dos Usuários, realizada em 2009, e diz que essa já é uma forma que quebra conceitos ultrapassados.
O internauta Armando questiona “com o advento do CAPs, os hospitais psiquiátricos deixarão de existir?” Eliza é clara em sua opinião e afirma que os hospitais psiquiátricos devem deixar de existir, não só concretamente, mas na cabeça das pessoas. “A meta da reforma psiquiátrica é colocar fim aos hospitais psiquiátricos. Isso não significa que produziremos desassistência. Essa é uma urgência. Pessoas continuam morrendo e sendo maltratadas e isso é um problema no Brasil. Quanto mais a gente avança na desconstrução destas ideias manicomiais, mais temos força para desmontar os manicômios” explica a psicóloga Zaneratto.
O vídeo deste
#DebateOnlineCFP será disponibilizado em
nosso canal no Youtube em breve. Atualmente existem diversos vídeos, tanto de debates como de seminários, disponíveis para visualização.
Fonte: Conselho Federal de Psicologia