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terça-feira, 19 de novembro de 2013

Suicídio: coragem ou fraqueza?


“A vida só tem sentido se tiver uma porta de saída emergencial”
“A vida só tem sentido se tiver uma porta de saída emergencial”, dizia um filósofo vitoriano. E o tema segue nos incomodando, deixando um legado de culpas indescritível para quem teve parentes, amigos ou conhecidos que deram fim à própria vida. Suicídio é como os três pontinhos, algo reticente, como um fim que não se acaba... Tema doloroso, obscuro e até proibido de ser abordado na mídia, face a estatísticas que apontam para o aumento de casos quando vem à tona.
Mas, sem dúvida, o auto-extermínio se confunde com a existência humana ou talvez, nos anteceda, pois há estudos que mostram que o encalhe das baleias ou atropelamento de cachorros abandonados em rodovias talvez fosse um ato voluntário, e igualmente correlacionado a uma baixa do neurotransmissor comum aos mamíferos, a serotonina, que tem papel fundamental na área que regula o estresse e as emoções, comprovadamente diminuída nos casos de suicídio.

Quem sabe, se a percepção de que suicidar tenha um lado fisiológico na maioria das vezes, não seja um alento que ajude a compreender e perdoar aquela pessoa que abandonou o caminho?
Afinal, em grande parte dos casos é indissociável da depressão severa. Daí a pergunta que acompanha as tragédias da morte por auto-extermínio: é necessário ter coragem extrema ou padecer de uma fraqueza imperdoável? Infelizmente, nos mais de trinta anos que exerci a psiquiatria, tive pacientes que cometeram suicídio e sentia uma dor inenarrável. E sempre me reuni com os parentes para partilhar toda minha vivência, no sentido que ninguém se culpasse. Afinal, querer viver ou morrer é o maior e mais existencial dos arbítrios que existe!
No momento fatal, absolutamente nenhum ser humano tem a menor condição de dissuadir o suicida, pois naquele “segundo eterno e fatal”o desejo de morte para fugir da desesperança que vence a fé, morrer parece ser um alívio.

Infelizmente, nas depressões severíssimas, mesmo antidepressivos podem não adiantar. Podem xingar, mas em casos extremos, a eletroconvulsoterapia sob narcose, ou se quiserem, ECT, que é a versão moderna e sem o medieval uso nas primeiras décadas do século passado, é, segundo estudos americanos e europeus, um dos métodos mais eficientes para evitar uma tragédia. Ao longo da minha carreira, eu indiquei algumas poucas vezes e sei que salvei aqueles pacientes severíssimos e que não respondiam aos antidepressivos. Mas vai explicar para familiares, psicólogos muito refratários ou outros colegas que não estudam a fundo o tema!

Vale ainda dizer que temos tipos de potenciais suicidas:

1) Os primários, ou seja, aquele que realmente optam pelo suicídio e usam meios quase sempre irreversíveis - pulam de prédios altos, usam arma de fogo, enforcam-se. Em geral, é o que acontece em depressões gravíssimas, em portadores de Desordem Afetiva Bipolar em fase depressiva severa e em psicóticos quando em delírio de perseguição ou alucinações.

2) Suicídio por problemas existenciais insuportáveis, como perdas financeiras, afetivas, doenças graves, incapacitantes, ou por luto. Enfim, uma pressão que determine um desejo de escape.

3) Teatralidade, que é mais comum no nosso dia-a-dia, no qual tomar comprimidos, cortar os pulsos e qualquer forma que possibilite ajuda quando o “ suicida crônico”, com inúmeras “tentativas”, visa muito mais a chantagem emocional, chamar atenção, em suma, ter ganhos secundários simulando tragédias.

Por fim, vale a pena dizer que em determinadas culturas o suicídio é aceito, como na Segunda Guerra, em que os pilotos japoneses intencionalmente morriam pois teriam compensações além vida. Assim como em determinadas religiões, como no extremo islamismo, em que homens-bomba seriam compensados com a eternidade gloriosa. Chama atenção o aumento mundial dos casos de suicídios, agravada com a crise financeira do fastio dos nórdicos que têm todos os direitos e garantias do estado, e no entanto suicidam muito (há aqueles que relacionam com a depressão de inverno em que a falta de luz interfere no humor ). O certo é que pessoas de fé têm incidência mais baixa, assim como aqueles que não têm depressão ou esquizofrenia.

Há ainda um alerta para o suicídio entre adolescentes e adultos jovens (14 por dia no Brasil), usuários de bebida e drogas e os idosos. Mas terminarei dizendo que desejo de morrer é absolutamente comum e grande parte da população, em momentos de sofrimento intenso, já pensou na morte como alternativa à dor e desespero. E como será a eternidade do suicida? Inferno, limbo, purgatório? Este é um assunto que vale uma nova coluna. E atenção: hoje a medicina, a busca religiosa, a família e amigos têm muito mais recursos no acolhimento e tratamento das ideias de suicídio e quadros psiquiátricos. Fé e ciência deveriam dar as mãos e abraçar as dores da alma!

Fonte: Associação Brasileira de Psiquiatria - ABP
 
Disponível em: <http://www.abp.org.br/portal/imprensa/clipping-2>. Acesso em: 19 nov. 2013

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