Um artista pode ter sua vida contada em um livro ou nos cinemas, mesmo que ele ou a sua família não autorize? A trajetória de um político pode ser contada com detalhes por um biógrafo, mesmo sem qualquer autorização prévia? Um dos casos mais emblemáticos dessa discussão envolve um dos artistas mais populares do país: Roberto Carlos. Em 2006, a Justiça brasileira mandou retirar das lojas o livro Roberto Carlos em detalhes (Editora Planeta), escrito por Paulo César de Araújo. O livro não tinha autorização do “rei” para ser publicado.
Um seminário promovido pela Globo Universidade e pela Universidade de São Paulo (USP), realizado nesta quinta-feira (15), em São Paulo, debateu a propriedade intelectual. Um dos módulos do evento abordou, justamente, a questão das biografias não autorizadas e a liberdade de expressão.
Para o procurador do Estado do Rio de Janeiro e professor de Direito da Universidade do Rio de Janeiro (Uerj), Gustavo Binenbojm, as contestações de biografias acontecem em função dos artigos 20 e 21 do Código Civil Brasileiro, de 2002, cujo texto diz que: Salvo se autorizadas (...) a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas, a seu requerimento e sem prejuízo da indenização que couber, se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se se destinarem a fins comerciais. No caso de morte ou ausência do biografado, esse direito é extensivo ao cônjuge, ascendentes ou os descendentes.
“Esses artigos ignoram o direito de expressão e maximizam o direito à privacidade”, diz Binenbojm. Para ele, as decisões dos tributais para recolhimento ou proibição desse tipo de obra causam um efeito silenciador e ferem a liberdade de expressão, garantida pela Constituição Federal.
Os artigos do Código Civil também garantem aos biografados ou familiares a leitura ou vista prévias das obras, o que, segundo o procurador, causa a censura prévia. “Muito biografados usam, inclusive, isso com barganha para não impedirem a publicação das obras”, afirma Binenbojm.
Há pelo menos três projetos de lei para alterar o Código Civil. Os deputados federais Manuela D’Ávila (PC do B – RS), Newton Lima Neto (PT – SP) e Otávio Leite (PSBD – RJ) defendem uma maior liberdade na publicação de informações sobre pessoas públicas.
O procurador afirma que o Supremo Tribunal Federal tem demonstrado uma grande preocupação com a preservação da liberdade de expressão e cita a decisão favorável à Marcha da Maconha como principal exemplo.
A opinião de Binenbojm é compartilhada pelo professor de Direito Constitucional da Uerj, Daniel de Moraes Sarmento. “Eu sou bem radical nesse assunto. O Brasil não é um país que pode se orgulhar da liberdade de expressão", diz Sarmento, comparando o artigo com o cerceamento do trabalho da imprensa ao longo da história do país. Os dois convidados do seminário também concordam que uma pessoa que constrói uma vida pública acaba “perdendo” o direito à vida privada.
Para ele, o artigo 20 do Código é inconstitucional. “Não há salvação para ele”, afirma Sarmento. “O legislador protegeu apenas um lado: o da personalidade, tirando o direito à liberdade de expressão”.
Mas qual seria o limite, então? “A falta de verdade ou a difamação”, afirma Sarmento, defendendo que, nesses casos, o atingido deve abrir um processo para contestar as informações ou exigir reparos, inclusive uma indenização por danos morais. “É preciso observar também o que é de interesse público”, diz.
De acordo com Sarmento, o fato de parlamentares de diferentes partidos (PT, PC do B e PSDB) criarem projetos para a alteração da lei que regulamenta a publicação de biografias caracteriza que há um interesse comum sobre a questão. Apesar das iniciativas, o professor da Uerj tem dúvidas quanto a mudanças efetivas sobre o assunto. “Isso implicaria numa liberdade de biografias dos próprios parlamentares. Duvido que eles queiram”, diz.
A cantora Sandra de Sá, que estava presente no evento, disse que a melhor maneira de lidar com o assunto é “deixar rolar”. Ela diz que não se importaria se alguém escrevesse a sua biografia, mas que ficaria atenta para eventuais inverdades. “Aí, sim, eu iria contestar a obra na Justiça”, diz Sandra. Mas existe algo que Sandra proibiria de ser contado? “Acho que não. O importante é ser correto na vida para evitar esse tipo de chateação depois", afirma a cantora.
Um seminário promovido pela Globo Universidade e pela Universidade de São Paulo (USP), realizado nesta quinta-feira (15), em São Paulo, debateu a propriedade intelectual. Um dos módulos do evento abordou, justamente, a questão das biografias não autorizadas e a liberdade de expressão.
Para o procurador do Estado do Rio de Janeiro e professor de Direito da Universidade do Rio de Janeiro (Uerj), Gustavo Binenbojm, as contestações de biografias acontecem em função dos artigos 20 e 21 do Código Civil Brasileiro, de 2002, cujo texto diz que: Salvo se autorizadas (...) a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas, a seu requerimento e sem prejuízo da indenização que couber, se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se se destinarem a fins comerciais. No caso de morte ou ausência do biografado, esse direito é extensivo ao cônjuge, ascendentes ou os descendentes.
“Esses artigos ignoram o direito de expressão e maximizam o direito à privacidade”, diz Binenbojm. Para ele, as decisões dos tributais para recolhimento ou proibição desse tipo de obra causam um efeito silenciador e ferem a liberdade de expressão, garantida pela Constituição Federal.
Os artigos do Código Civil também garantem aos biografados ou familiares a leitura ou vista prévias das obras, o que, segundo o procurador, causa a censura prévia. “Muito biografados usam, inclusive, isso com barganha para não impedirem a publicação das obras”, afirma Binenbojm.
Há pelo menos três projetos de lei para alterar o Código Civil. Os deputados federais Manuela D’Ávila (PC do B – RS), Newton Lima Neto (PT – SP) e Otávio Leite (PSBD – RJ) defendem uma maior liberdade na publicação de informações sobre pessoas públicas.
O procurador afirma que o Supremo Tribunal Federal tem demonstrado uma grande preocupação com a preservação da liberdade de expressão e cita a decisão favorável à Marcha da Maconha como principal exemplo.
A opinião de Binenbojm é compartilhada pelo professor de Direito Constitucional da Uerj, Daniel de Moraes Sarmento. “Eu sou bem radical nesse assunto. O Brasil não é um país que pode se orgulhar da liberdade de expressão", diz Sarmento, comparando o artigo com o cerceamento do trabalho da imprensa ao longo da história do país. Os dois convidados do seminário também concordam que uma pessoa que constrói uma vida pública acaba “perdendo” o direito à vida privada.
Para ele, o artigo 20 do Código é inconstitucional. “Não há salvação para ele”, afirma Sarmento. “O legislador protegeu apenas um lado: o da personalidade, tirando o direito à liberdade de expressão”.
Mas qual seria o limite, então? “A falta de verdade ou a difamação”, afirma Sarmento, defendendo que, nesses casos, o atingido deve abrir um processo para contestar as informações ou exigir reparos, inclusive uma indenização por danos morais. “É preciso observar também o que é de interesse público”, diz.
De acordo com Sarmento, o fato de parlamentares de diferentes partidos (PT, PC do B e PSDB) criarem projetos para a alteração da lei que regulamenta a publicação de biografias caracteriza que há um interesse comum sobre a questão. Apesar das iniciativas, o professor da Uerj tem dúvidas quanto a mudanças efetivas sobre o assunto. “Isso implicaria numa liberdade de biografias dos próprios parlamentares. Duvido que eles queiram”, diz.
A cantora Sandra de Sá, que estava presente no evento, disse que a melhor maneira de lidar com o assunto é “deixar rolar”. Ela diz que não se importaria se alguém escrevesse a sua biografia, mas que ficaria atenta para eventuais inverdades. “Aí, sim, eu iria contestar a obra na Justiça”, diz Sandra. Mas existe algo que Sandra proibiria de ser contado? “Acho que não. O importante é ser correto na vida para evitar esse tipo de chateação depois", afirma a cantora.
Fonte: Revista Época
Diponivel em:<http://revistaepoca.globo.com/cultura/noticia/2011/09/biografias-precisam-ser-autorizadas.html>. Acesso em: 16 set. 2011
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