
Um seminário promovido pela Globo Universidade e pela Universidade de São Paulo (USP), realizado nesta quinta-feira (15), em São Paulo, debateu a propriedade intelectual. Um dos módulos do evento abordou, justamente, a questão das biografias não autorizadas e a liberdade de expressão.
Para o procurador do Estado do Rio de Janeiro e professor de Direito da Universidade do Rio de Janeiro (Uerj), Gustavo Binenbojm, as contestações de biografias acontecem em função dos artigos 20 e 21 do Código Civil Brasileiro, de 2002, cujo texto diz que: Salvo se autorizadas (...) a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas, a seu requerimento e sem prejuízo da indenização que couber, se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se se destinarem a fins comerciais. No caso de morte ou ausência do biografado, esse direito é extensivo ao cônjuge, ascendentes ou os descendentes.
“Esses artigos ignoram o direito de expressão e maximizam o direito à privacidade”, diz Binenbojm. Para ele, as decisões dos tributais para recolhimento ou proibição desse tipo de obra causam um efeito silenciador e ferem a liberdade de expressão, garantida pela Constituição Federal.
Os artigos do Código Civil também garantem aos biografados ou familiares a leitura ou vista prévias das obras, o que, segundo o procurador, causa a censura prévia. “Muito biografados usam, inclusive, isso com barganha para não impedirem a publicação das obras”, afirma Binenbojm.
Há pelo menos três projetos de lei para alterar o Código Civil. Os deputados federais Manuela D’Ávila (PC do B – RS), Newton Lima Neto (PT – SP) e Otávio Leite (PSBD – RJ) defendem uma maior liberdade na publicação de informações sobre pessoas públicas.
O procurador afirma que o Supremo Tribunal Federal tem demonstrado uma grande preocupação com a preservação da liberdade de expressão e cita a decisão favorável à Marcha da Maconha como principal exemplo.
A opinião de Binenbojm é compartilhada pelo professor de Direito Constitucional da Uerj, Daniel de Moraes Sarmento. “Eu sou bem radical nesse assunto. O Brasil não é um país que pode se orgulhar da liberdade de expressão", diz Sarmento, comparando o artigo com o cerceamento do trabalho da imprensa ao longo da história do país. Os dois convidados do seminário também concordam que uma pessoa que constrói uma vida pública acaba “perdendo” o direito à vida privada.
Para ele, o artigo 20 do Código é inconstitucional. “Não há salvação para ele”, afirma Sarmento. “O legislador protegeu apenas um lado: o da personalidade, tirando o direito à liberdade de expressão”.
Mas qual seria o limite, então? “A falta de verdade ou a difamação”, afirma Sarmento, defendendo que, nesses casos, o atingido deve abrir um processo para contestar as informações ou exigir reparos, inclusive uma indenização por danos morais. “É preciso observar também o que é de interesse público”, diz.
De acordo com Sarmento, o fato de parlamentares de diferentes partidos (PT, PC do B e PSDB) criarem projetos para a alteração da lei que regulamenta a publicação de biografias caracteriza que há um interesse comum sobre a questão. Apesar das iniciativas, o professor da Uerj tem dúvidas quanto a mudanças efetivas sobre o assunto. “Isso implicaria numa liberdade de biografias dos próprios parlamentares. Duvido que eles queiram”, diz.
A cantora Sandra de Sá, que estava presente no evento, disse que a melhor maneira de lidar com o assunto é “deixar rolar”. Ela diz que não se importaria se alguém escrevesse a sua biografia, mas que ficaria atenta para eventuais inverdades. “Aí, sim, eu iria contestar a obra na Justiça”, diz Sandra. Mas existe algo que Sandra proibiria de ser contado? “Acho que não. O importante é ser correto na vida para evitar esse tipo de chateação depois", afirma a cantora.
Fonte: Revista Época
Diponivel em:<http://revistaepoca.globo.com/cultura/noticia/2011/09/biografias-precisam-ser-autorizadas.html>. Acesso em: 16 set. 2011
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.