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sexta-feira, 5 de julho de 2013

Relatos clínicos literários ajudam a construir a psicanálise


A construção de relatos clínicos que eventualmente atingem unidade estética ajuda no desenvolvimento da Psicanálise, entendida como método de conhecimento. Esta é a hipótese desenvolvida pela psicóloga Fernanda Sofio, na sua tese Literacura? Psicanálise como forma literária: uma interpretação estética vislumbrada, realizada no Instituto de Psicologia (IP) da USP, sob orientação do professor João Augusto Frayze-Pereira.
Para a psicóloga, os relatos clínicos que vão sendo construídos com pacientes podem constituir-se de maneira estética. É esta construção que Fernanda entende que pode fazer a Psicanálise avançar, sempre na perspectiva dela ser entendida como forma literária.
Fernanda definiu sua prática clínica como forma que permite vislumbrar unidade estética em relatos feitos com pacientes psicanalíticos, assim como em outras especulações narrativas nesse campo. Foi na forma literária que Fernanda encontrou a tradução para certos embates clínicos, semelhantes aos de Riobaldo – narrador de Grande Sertão: Veredas, livro de Guimarães Rosa – cultivados com seu interlocutor desconhecido.
Fernanda tomou como base o livro de psicanálises literárias A infância de Adão e outras ficções freudianas, de Fabio Herrmann. Na ficção central, que dá nome ao livro, produz-se um paradoxo ao se referir à infância de uma personagem que, como se sabe, “nasceu” adulta. Essa construção paradoxal resulta na metáfora de um processo analítico no qual, ao que tudo indica, Adão é “paciente” e é o seu ouvinte, um “analista”, ao mesmo tempo. Contribui para essa analogia a técnica de fluxo de consciência “joyceana”, isto é, inspirada no escritor irlandês James Joyce. A ideia do termo empregado por Fernanda, “literacura”, surgiu no estudo desta narração.
“Adão pode ser pensado como o everyman da clínica psicanalítica” escreve a psicóloga em sua tese. No caso, o “everyman” seria uma espécie de paciente genérico. “Não porque todos digam o mesmo que Adão ou produzam o mesmo fluxo de consciência que ele, é claro, mas porque o processo analítico ao que a personagem se submete – ou é submetida por seu autor – é análogo ao de qualquer paciente em análise.”
Literacura
Pensar no entremear da Psicanálise com a Literatura ajuda a tornar mais preciso o conhecimento que se tem do método psicanalítico, esclarece a psicóloga. Seja no caso dos relatos clínicos ou das análises literárias, a forma é literária e a estrutura é interpretativa, ela explica. “Literacura, sendo Psicanálise, é o próprio método psicanalítico”, diz, “mas traz a baila, especificamente, pensar sobre o que esse método faz.” O sufixo “cura” indica a ideia de “ponto de maturação”, característico das psicanálises. Ao construir uma narrativa com um paciente, que o aproxima de seu desejo, o analista pode adicionalmente vislumbrar um relato estético, harmonizando forma, função e estrutura narrativas.
Para a psicóloga, trabalhar desta maneira permite chegar ao âmago da propriedade psicanalítica. É desta forma que Fernanda já atua nos seus atendimentos. “Desenvolvo o estudo teórico que resultou na ideia de ‘literacura’ desde 2004, mas iniciei a tese propriamente dita em 2009”, ela conta. “Meu trabalho desenvolve a ideia de se pensar a Psicanálise como forma literária, no âmbito clínico-teórico”.
Segundo Fernanda, pensar as psicanálises como narrativas e, eventualmente, unidades estéticas, contribui para a criação de novas teorias psicanalíticas, constantemente em risco de se perderem. “Pela ficção, talvez possamos voltar à teoria produtivamente – entendendo por produtivo o pensamento que gera saber sobre um novo campo da vida anímica”, cita Herrmann. E ela finaliza, “é o particular literário que produz o universal metodológico em cada caso, não o contrário”.
 
Fonte: Agência USP de Noticias
 
Disponível em: <http://www.usp.br/agen/?p=143804>. Acesso em: 04 jul.2013.

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