Pesquisa da Escola de Enfermagem (EE) da USP concluiu que a depressão
pós-parto atinge mulheres de forma duradoura e as desarranja, como um
quebra-cabeça. O enfermeiro Hudson Pires de Oliveira Santos Júnior defendeu sua
tese de doutorado em janeiro de 2013, que teve como base entrevistas com mães
que ainda sofriam do transtorno e seus familiares.
Santos Júnior iniciou o estudo motivado pela falta de reconhecimento da
doença. Segundo ele, o Ministério da Saúde não estabelece estratégias para
tratar as mulheres afetadas, portanto, os profissionais da saúde da Estratégia
Saúde da Família não estão preparados para diagnosticar e tratar as mães que
sofrem da doença. Além disto, os serviços de atendimento a doenças psíquicas
graves, como por exemplo, a esquizofrenia, muitas vezes não têm atendimento
específico para a depressão pós-parto. A pesquisa utilizou o método
interpretativo descritivo. Ao todo foram entrevistadas 15 mulheres com o
transtorno e 9 familiares indicados por elas, com observações no domicílio das
participantes e anotações em um diário de campo.
Um dos maiores desafios do estudo é que as mulheres e os familiares tiveram
dificuldade de identificar a depressão pós-parto. Enquanto as mulheres não
aceitavam que isso pudesse acontecer em uma época que é esperada felicidade e
satisfação por ter um bebê, os familiares encaravam os sintomas como
“frescura”.
O pesquisador já sabia, por intermédio de outras pesquisas, que as mães com
depressão pós-parto, em alguns casos, pensam em machucar as crianças, o que
dependia de fatores culturais. A pesquisa, feita com famílias de São Paulo,
concluiu que “as mulheres que participaram da pesquisa nomeiam isto como
pensamentos ruins”. Nas entrevistas, o pesquisador identificou também que as
mães descreveram dois possíveis agentes de agressão contra as crianças. Algumas
delas descreveram a si mesmas fazendo algum mal aos seus filhos, sufocando ou
afogando, enquanto outras, pensavam que a violência viria de agentes externos,
mesmo não descrevendo claramente o que seria. Esse resultado tem relevância ao
diagnosticar a mulher que passa pelo problema, já que aponta para a forma com
que, na nossa sociedade, se fala sobre esse sintoma. Assim, o termo “pensamentos
ruins”, pode ser usado como recurso auxiliar o rastreio da depressão
pós-parto.
Como resposta das mulheres aos pensamentos ruins e de acordo com a
disponibilidade de suporte familiar, Santos Júnior revela quatro tipos de
maternidade que as mães adotaram na trajetória da doença: transferido,
compartilhado, forçado e superprotetor.
Segundo o pesquisador, esse achado chama atenção para repensar nos casos de
mães que abandonam ou agridem filhos recém-nascidos, pois a comunidade tem
criminalizado as mulheres, quando em alguns casos elas podem estar sofrendo com
sintomas de depressão pós-parto, precisando de atenção e tratamento.
“Pesquisadores, governantes e profissionais da saúde precisam compartilhar o
compromisso de montar estratégias e protocolos para promover a identificação e
tratamento precoce da depressão pós-parto, evitando assim prejuízos de saúde
para as mulheres, seus filhos e familiares”, afirma o enfermeiro.
O quebra-cabeça
O grande tempo de tratamento destas
mulheres surpreendeu o enfermeiro. Isto evidencia o que concluiu em sua tese: as
mães que sofrem de depressão pós-parto têm o quebra-cabeça de sua vida
desarranjado e demoram a remontá-lo. Ele explica a metáfora “as duas peças
principais do quebra-cabeça seriam a maternidade e a identidade, e a depressão
pós-parto desarranja isso porque essa mulher esperava que a maternidade fosse
ser prazerosa, que ela fosse amar a criança, que ela fosse saber cuidar e no
final elas viram que por causa da depressão as coisas não caminharam dessa
forma”. Mesmo estando com sintomas de depressão, a identidade dessas mães foi
negligenciada, pois os sintomas de depressão pós-parto foram ignorados, desde
que elas estivessem cuidando da criança.
Ao final, as próprias mulheres e familiares concluem que as peças não se
encaixam como antes, pois a experiência depressão pós-parto modificou a forma
como percebiam a própria identidade e a forma como percebiam e exerciam a
maternidade. Mesmo depois de tratadas, elas possuem medo da depressão, têm
sentimentos de ter falhado como mãe, e mencionam que o relacionamento com os
maridos/companheiros foi afetado.
Fonte: Agencia USP
Disponível em: <http://www.usp.br/agen/?p=133831>. Acesso em: 16 abr. 2013.
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