Glamurizados no senso comum como uma alternativa aos horrores da prisão, os manicômios judiciários, chamados oficialmente de hospitais de custódia e tratamento psiquiátrico, deveriam receber os doentes mentais que cometeram crimes para tratá-los. Mas, uma vez ultrapassadas as portas de entrada desses locais invisíveis aos olhos da sociedade e do governo, retornar à liberdade se torna algo improvável no Brasil. Mesmo com o exame atestando o fim da periculosidade, 35% dos internos continuam trancafiados. Em 14% dos casos, há, inclusive, decisão judicial expressa determinando a liberação. Muitos, porém, perderam qualquer vínculo com o mundo externo. Vinte e cinco por cento estão há mais de 15 anos dentro dos estabelecimentos — tempo que poucos criminosos ficam atrás das grades no país, ainda que sejam autores de barbaridades. Mais grave ainda: 85% deles não tinham qualquer antecedente criminal, que pudesse justificar um rigor maior, quando cometeram o delito.
As constatações sombrias fazem parte de um estudo inédito encomendado pelo Ministério da Justiça (MJ) sobre as medidas de segurança aplicadas no país a doentes mentais considerados incapazes de compreender os próprios atos. Divulgados pelo Correio com exclusividade, os dados dizem respeito aos manicômios judiciários da Bahia e de Minas Gerais, primeiros estados a participarem do estudo, que abrigam, juntos, 228 internos. Para o secretário de Assuntos Legislativos do MJ, Marivaldo de Castro Pereira, os resultados exigem providências rápidas e até alguma modernização legislativa. "Temos urgência de adequar o sistema de medida de segurança aos direitos e garantias constitucionais. Vemos que ele é mais rígido com os inimputáveis do que com os que têm condições mentais de entender o que fizeram", afirma o secretário.
As constatações sombrias fazem parte de um estudo inédito encomendado pelo Ministério da Justiça (MJ) sobre as medidas de segurança aplicadas no país a doentes mentais considerados incapazes de compreender os próprios atos. Divulgados pelo Correio com exclusividade, os dados dizem respeito aos manicômios judiciários da Bahia e de Minas Gerais, primeiros estados a participarem do estudo, que abrigam, juntos, 228 internos. Para o secretário de Assuntos Legislativos do MJ, Marivaldo de Castro Pereira, os resultados exigem providências rápidas e até alguma modernização legislativa. "Temos urgência de adequar o sistema de medida de segurança aos direitos e garantias constitucionais. Vemos que ele é mais rígido com os inimputáveis do que com os que têm condições mentais de entender o que fizeram", afirma o secretário.
De imediato, ele destaca a necessidade de garantir que o exame de cessação de periculosidade, que dá ao juiz elementos para determinar o fim da internação, seja feito como manda a lei, anualmente. A realidade dos locais, verdadeiras cadeias em vez de hospitais, é outra. "Encontramos 65% sem exames. Alguns podem ter feito e não ficou atestado o fim da periculosidade. Mas grande parte simplesmente não tem o exame realizado há tempos. As políticas públicas são falhas, desde a garantia do direito de passar pelo exame periodicamente às ações de reinserção social, de residências terapêuticas", diz a antropóloga Debora Diniz, que coordenou o estudo, realizado pela organização não governamental Anis — Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero. Ela aponta o absurdo das internações tão prolongadas. "Nenhum homicida sem antecedentes fica mais que seis anos na prisão. O que justifica o doente mental permanecer 15, 20, 30 anos ou mais?"
Mito
A marca de 85% dos internos sem vida pregressa criminal, segundo José Geraldo Taborda, psiquiatra forense e professor da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre, derruba outro mito, o do serial killer. "Não temos nenhum Hanibbal dentro de hospitais de custódia. Quem está lá são doentes mentais que não receberam atendimento adequado nos serviços de saúde e, um dia, surtaram em tal nível que acabaram cometendo um crime", destaca Taborda. A pesquisa mostra que o homicídio é o delito mais comum, praticado por quase 60% dos homens e mulheres que cumprem medida de segurança. As vítimas preferenciais, em 41% dos casos, são cônjuges ou familiares — geralmente quem cuida do doente em sofrimento mental. Para 42% dos internos, o diagnóstico é a esquizofrenia.
A marca de 85% dos internos sem vida pregressa criminal, segundo José Geraldo Taborda, psiquiatra forense e professor da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre, derruba outro mito, o do serial killer. "Não temos nenhum Hanibbal dentro de hospitais de custódia. Quem está lá são doentes mentais que não receberam atendimento adequado nos serviços de saúde e, um dia, surtaram em tal nível que acabaram cometendo um crime", destaca Taborda. A pesquisa mostra que o homicídio é o delito mais comum, praticado por quase 60% dos homens e mulheres que cumprem medida de segurança. As vítimas preferenciais, em 41% dos casos, são cônjuges ou familiares — geralmente quem cuida do doente em sofrimento mental. Para 42% dos internos, o diagnóstico é a esquizofrenia.
Analfabetos ou com poucos anos de estudo (82%), pardos e negros (63%), com 40 anos ou mais (63%), solteiros (81%) e sem qualquer profissão (22%), os loucos que cometem crimes no país têm um perfil marcado por vulnerabilidades. "É um indivíduo absolutamente dependente do Estado. Ele não é um perigo permanente, como a fantasia da elite ou dos jornais faz parecer. Representa perigo, se é que essa palavra cabe, aos seus familiares se não estiver em tratamento", afirma Debora. Taborda ressalta outra dificuldade na desinternação dos doentes mentais: o afastamento da família. "Imagine que o seu irmão matou sua mãe. Você tem filhos, tem família, é lógico que há uma resistência em receber essa pessoa. Então, elas simplesmente não têm para onde ir. Não existem políticas para isso", afirma o psiquiatra.
Uma discriminação que atenta contra o objetivo da internação no hospital de custódia, que é o tratamento, é a não inclusão dos pacientes no Sistema Único de Saúde (SUS), segundo Taborda. Ele aponta uma situação peculiar em Porto Alegre, onde atua, como exemplo de "absurdo". "Temos o Hospital São Pedro, onde pacientes psiquiátricos recebem atendimento gratuito pelo SUS. Do outro lado do muro, os internos do Instituto Maurício Cardoso, um hospital de custódia, não são assistidos. Como estão ligados à Secretaria de Justiça, o serviço à saúde depende dessa pasta. E a alegação de falta de recursos, falta de pessoal, em todos os governos, se repete", critica o psiquiatra.
Pesquisa inédita sobre as medidas de segurança em manicômios judiciais mostra que, apesar de exame atestando o fim da periculosidade, 35% dos internos não conseguem voltar à liberdade. Ministério da Justiça reconhece a gravidade da situação.
Pesquisa inédita sobre as medidas de segurança em manicômios judiciais mostra que, apesar de exame atestando o fim da periculosidade, 35% dos internos não conseguem voltar à liberdade. Ministério da Justiça reconhece a gravidade da situação.
Fonte: Associação Brasileira de Psiquiatria
Disponível em:<http://abp.org.br/2011/medicos/imprensa/clipping-2>. Acesso em: 06 dez. 2011
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