Aproximadamente 2 milhões de brasileiros teriam usado crack pelo menos uma vez na vida, segundo levantamento
Um levantamento conduzido em 149 municípios brasileiros indica que o país está entre os maiores consumidores de cocaína no mundo, tanto na sua forma intranasal (aspirado) como na mistura de crack – a cocaína solidificada em cristais –, composta de pasta de cocaína, bicarbonato de sódio e água (inalado). No estudo, pesquisadores do Departamento de Psiquiatria da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e da University of Texas School of Public Health, nos Estados Unidos, entrevistaram 4.607 indivíduos com 14 anos ou mais, entre os quais 1.157 adolescentes. Do total, 3,9% relataram já ter consumido cocaína ao menos uma vez na vida, enquanto 1,7% afirmou ter usado a substância nos 12 meses que antecederam o levantamento. O estudo, publicado na edição de janeiro da revistaAddictive Behaviors, mostrou ainda que 1,5% dos entrevistados já experimentou cracke, destes, 0,8% consumiu a substância em 2011.
Segundo a psicóloga Ilana Pinsky, pesquisadora da Unifesp e uma das autoras do estudo, os resultados podem ser generalizados para toda a população brasileira, já que baseiam-se em entrevistas conduzidas em todos os estados do país. Em outras palavras, os dados apresentados forneceriam um panorama probabilístico do consumo da substância entre a população adulta e adolescente do Brasil. “Estimamos que 4% da população, o equivalente a 5,2 milhões de pessoas, tenha consumido cocaína pelo menos uma vez na vida, seja em pó, por via nasal, ou na forma de crack, e que 2,2%, ou 3,2 milhões de pessoas, tenham usado a substância somente em 2011”, conta. Em relação ao consumo da cocaína na forma de crack, chega a aproximadamente 2 milhões o número de pessoas que teriam consumido a mistura pelo menos uma vez na vida e 1,1 milhão os indivíduos que o consumiram em 2011. Hoje, a prevalência de usuários no país já é semelhante à dos Estados Unidos, 2% da população.
Quase metade dos usuários (45%) experimentou a substância pela primeira vez antes dos 18 anos, mostrou o levantamento, o que reflete, segundo Ilana, a necessidade de se investir na prevenção de certos comportamentos de risco ainda na pré-adolescência. Já os índices de dependência entre aqueles que consumiram a substância pelo menos uma vez na vida foi de 15,6%, enquanto entre os que a usaram alguma vez nos 12 meses que antecederam o estudo esse número subiu para 41,4%.
A maioria dos que experimentaram cocaína antes dos 18 anos eram homens, de acordo com o estudo. “Comparado às mulheres, a probabilidade dos homens experimentarem a droga é 4,4 vezes maior”, diz a psicóloga. Ela explica que os homens estão mesmo mais associados a comportamentos de risco, mas que o comportamento das mulheres vem mudando. Esse mesmo levantamento mostrou que elas estão bebendo mais e com mais frequência. A proporção das que consomem álcool de maneira excessiva, por exemplo, aumentou 24%, passando de 15% para 18,5%, entre 2006 e 2012.
Para chegarem a esses resultados os pesquisadores analisaram dados do Segundo Levantamento Nacional de Álcool e Drogas (Lenad), conduzido entre novembro de 2011 e março de 2012 pelo Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia para Políticas Públicas do Álcool e Outras Drogas (Inpad) da Unifesp, com apoio da FAPESP e sob coordenação do psiquiatra Ronaldo Laranjeira. O objetivo foi avaliar os padrões de consumo e dependência associados ao álcool, tabaco e drogas ilícitas, além de possíveis fatores de risco.
O levantamento mostrou também que o consumo da substância é maior no Sudeste, com 45% dos usuários. Em contrapartida, a região Centro-Oeste apresentou os maiores índices de uso da droga nos 12 meses anteriores ao levantamento, tanto por via nasal (2,7%) como na mistura de crack (1,8%). “Uma explicação possível para esse dado seria a proximidade dos estados dessa região com países produtores, como a Bolívia, diferentemente da região Sul, que registrou os menores índices de consumo (0,4%) da droga no mesmo período”, explica a psicóloga Clarice Sandi Madruga, também da Unifesp e uma das autoras do artigo.
Vários são os fatores que ajudariam a explicar a prevalência no uso da droga no Brasil. Para as pesquisadoras, o preço é um deles. Por aqui, uma pedra de crack custa US$ 2; nos Estados Unidos, esse valor chega a US$ 20. Segundo elas, o aumento do poder aquisitivo da população brasileira nos últimos anos e a proximidade geográfica com o Peru, Colômbia e Bolívia, países produtores da droga, também pode ter contribuído para a disseminação da substância no Brasil.
Para Ilana Pinsky, a complexidade do problema no Brasil torna necessária a realização periódica desse tipo de levantamento, de modo que o conhecimento gerado a partir dele possa servir para o desenvolvimento de estratégias de prevenção e tratamento de dependentes químicos no país. Também é importante estabelecer prioridades na agenda de políticas de saúde pública.
Estudo recente, liderado por Tania Marcourakis, da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo, verificou que fumar crack é mais danoso aos neurônios do que cheirar cocaína. A justificativa é que, ao consumi-lo, o indivíduo inala uma substância conhecido como metilecgonidina, que pode causar a morte de neurônios.
Artigo científico
ABDALLA, R. R. et al. Prevalence of Cocaine Use in Brazil: Data from the II Brazilian National Alcohol and Drugs Survey (BNADS). Addictive Behaviors. v. 39, p. 297-301. jan. 2014.
Fonte: Revista Pesquisa Fapesp
Disponível em: <http://revistapesquisa. fapesp.br/2014/01/13/estudo- avalia-prevalencia-uso-de- cocaina-brasil/>. Acesso em: 15 jan. 2014
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.