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quinta-feira, 21 de julho de 2016

Na corrida contra a demência

Com o aumento da expectativa de vida, chegam também os “males” dos desgastes impostos pelo tempo. A demência, que nos rouba de nós mesmos, talvez seja um dos mais temidos

“Sorte daqueles que não têm de morrer”, diz um provérbio tibetano que volta e meia me vem à cabeça. A frase – ligeiramente irônica, já que a finitude é inevitável – tem como contexto a crença na lei de causas e consequências, segundo a qual teremos de nos haver com as repercussões de nossos atos, intenções e palavras – nesta ou em outras existências. E não porque tenhamos de ser castigados, mas sim porque prevalece a ideia de que nada nos acontece sem que, em algum momento, tenhamos criado as causas para isso. Fazendo uma releitura do ditado oriental, tomo a liberdade de dizer teríamos sorte se não tivéssemos de envelhecer. Esse desfecho não é inevitável, claro, mas a alternativa também não parece nada atraente. Na maioria absoluta, ansiamos pela vida. O problema é que com o aumento dessa expectativa chegam também os “males” dos desgastes impostos pelo tempo. A demência, que nos rouba de nós mesmos, talvez seja um dos mais temidos. 

O mais prevalente desses quadros, é a doença de Alzheimer. A patologia pode ter evoluído concomitantemente com a inteligência humana. Em artigo publicado há algumas semanas no periódico científico bioRxiv, cientistas afirmaram ter encontrado evidências de que há entre 50 mil e 200 mil anos a seleção natural impulsionou mudanças em seis genes envolvidos no desenvolvimento cerebral, o que pode ter contribuído para aumentar a conectividade neuronal, tornando os humanos modernos mais inteligentes à medida que evoluíram de seus ancestrais hominídeos. Essa nova capacidade intelectual, porém, não veio sem custo: os mesmos genes estão implicados no Alzheimer. O geneticista Kun Tang, do Instituto de Ciências Biológicas de Xangai, na China, que liderou a pesquisa, especula que o distúrbio de memória se desenvolveu à medida que cérebros em processo de  envelhecimento lutavam com novas demandas metabólicas impostas pela crescente inteligência. 

Mas essa é só uma parte da história: se a capacidade de aprender e memorizar nos penaliza, é ela também que acena com a possibilidade de afastar a manifestação do Alzheimer, às vezes por vários anos ou até por toda a vida. Nesta edição, o neurocientista David A. Bennett, diretor do Centro Rush da Doença de Alzheimer em Chicago, um dos mais renomados pesquisadores na área, revela uma descoberta surpreendente: pessoas com a mesma condição cerebral podem apresentar estado mental completamente diferente, enquanto uma perde a memória, outra se mostra lúcida e capaz. Ou seja, mais importante do que o estado físico dos tecidos, é o uso que se faz deles, apesar dos danos. 

Para ganhar a corrida contra a demência, duas armas são fundamentais: afeto e exercício intelectual. Apostar no que faz bem, manter pessoas queridas por perto, cultivar relações de intimidade, cuidar de animais e se divertir, movimentar o corpo, passear, falar mais de um idioma e aprender coisas contribui para postergar o surgimento do Alzheimer e diminuir o número de anos que se passa doente no fim da vida. Curiosamente, parece que a prevenção está justamente no que tende a nos tornar mais felizes. Boa leitura! 

Fonte: Scientific American Mente e Cérebro

Riscos reais da pornografia virtual

busca por esse tipo de conteúdo costuma estar associada à violência contra as mulheres, insatisfação com a aparência e dúvidas sobre o valor do relacionamento afetivo estável – o que pode causar prejuízos para as relações da “vida real”

É possível fazer sexo com um computador? Parece que sim. Não no sentido literal, claro, mas é fato que grande número de pessoas tem uma “vida sexual” on-line bastante ativa. E se por um lado a internet se institucionalizou como forma prática de encontrar parceiros – e posteriormente conectar-se a eles “cara a cara”, sem a mediação da rede –, sob muitos aspectos esse meio também oferece respaldo para sintomas psicopatológicos, alguns capazes de prejudicar o próprio internauta e também terceiros. É o que ocorre no caso da pedofilia, que obviamente não está restrita ao mundo virtual, mas é inegável que esse recurso favorece a localização de possíveis vítimas. Pensando em uma situação talvez menos grave, a pessoa pode usar a tecnologia para se esconder, evitando o comprometimento afetivo. Pesquisas recentes sugerem que o excesso de pornografia de forma geral – e pela internet em particular – pode trazer riscos à saúde psíquica. Embora seja hipocrisia atribuir a essa mídia tamanha “responsabilidade”, é indiscutível  que a grande quantidade de material disponível e o aparente conforto do anonimato apresentam facilidades.
A pornografia pela rede é acessível a um custo baixo, o que tornou sua prática um “passatempo popular” e uma das mais lucrativas áreas do comércio eletrônico (e-commerce), movimentando bilhões de dólares em todo o mundo. Uma pesquisa  com estudantes realizada pela psicóloga Chiara Sabina, da Universidade Harrisburg, do Estado da Pensilvânia, revelou que mais de 90% dos homens e 60% das mulheres assistiam a cenas de sexo pela internet antes dos 18 anos. Outro estudo da mesma pesquisadora mostrou que entre pessoas de 40 a 49 anos a taxa de uso tinha menos da metade da frequência. Isso sugere que o consumo de pornografia na internet pode diminuir com a idade – embora seja válido considerar que essa estatística reflete que talvez os mais velhos passem menos horas diante do computador. Outros estudos já haviam mostrado diferenças das atividades sexuais virtuais em relação ao gênero: os homens parecem ser os mais adeptos da pornografia, enquanto as mulheres preferem participar de salas de bate-papo sobre sexo, sugerindo que procuram contextos de interação.
Preço do consumo
Embora a maioria das pessoas que assistem à pornografia pela internet pareça ser apenas apreciadora ocasional, existe uma porcentagem que faz uso abusivo do conteúdo sexual disponível on-line. Em 2008, o pesquisador Alvin Cooper, na época do Centro Marital e da Sexualidade em San Jose, Califórnia, e seus colaboradores realizaram um estudo com mais de 9 mil voluntários que usavam a internet com fins sexuais. Pouco menos da metade deles – a maioria homens casados ou com uma relação estável – dedicava uma hora ou menos por semana a essa atividade. Entre os ocasionais a sites de pornografia e eventuais experiências sexuais on-line estejam participantes da pesquisa, 45% admitiram reservar uma a dez horas por semana; 8% usavam a internet com essa finalidade durante 11 horas ou mais semanalmente; e uma porcentagem pequena, mas significativa, relatou passar mais de 70 horas por semana envolvida nessa prática.

Essas evidências sugerem que o uso muito frequente pode estar associado a efeitos prejudiciais no psiquismo e nos relacionamentos. Alguns especialistas ainda argumentam que a pornografia pela internet pode causar dependência, mas o uso do termo nesse contexto é controvertido.

Nenhum estudo confirma que visitas ocasionais a sites de pornografia e eventuais experiências sexuais on-line estejam associadas a problemas comportamentais – mas há uma linha tênue entre o que pode e o que não pode ser considerado prejudicial. Alguns pesquisadores já investigam se mesmo o uso esporádico desse recurso pode causar efeitos negativos ao relacionamento, como tensão entre os parceiros e condutas agressivas contra as mulheres. Pesquisas mostraram associações entre quantidade de exposição à pornografia e aprovação de atitudes como dominar a parceira com violência no momento da relação. Essas vinculações são mais fortes em homens que assistem à pornografia violenta e já têm tendência à impulsividade e ao sadismo.

Outras descobertas aproximam o uso frequente da pornografia a atitudes como atribuir culpa às vítimas de abuso sexual, justificando as ações de perpetradores sexuais e reduzindo a violência do estupro. O interesse desmedido por pornografia geralmente é acompanhado de crueldade contra as mulheres, insatisfação com a aparência e o desempenho sexual do parceiro e dúvidas sobre o valor do relacionamento afetivo estável. Essas atitudes costumam levar à desvalorização da figura feminina e, em alguns casos, podem estar associadas à violência doméstica.

Ainda assim, será possível concluir que assistir à pornografia provoca crenças e atitudes misóginas? A maioria dos estudos mostra apenas uma associação estatística entre o uso da pornografia  e essas características, e não a relação direta entre interesse por esse tipo de conteúdo e desenvolvimento de comportamentos específicos. Por exemplo, embora o hábito frequente de ver pornografia possa realmente provocar atos violentos contra as mulheres, talvez a violência já praticada contra elas possa, por sua vez, induzir ao interesse por pornografia. Além disso, é preciso levar em conta características de personalidade de determinados homens (entre elas imaturidade psicológica e impulsividade) e fatores culturais que favorecem tanto a busca por material pornográfico quanto a inclinação a praticar maus-tratos contra mulheres.

Os pesquisadores também perguntaram às parceiras de frequentadores assíduos de sites de sexo como elas se sentiam em relação aos hábitos deles. A psicóloga Ana Bridges, da Universidade do Arkansas, e seus colegas descobriram que muitas se sentiam ansiosas e desaprovavam a atitude do companheiro. Do total, 42% afirmaram que os parceiros eram homens bastante inseguros; 39% disseram que o hábito produzia efeito negativo no relacionamento; e 32% admitiram que, em períodos em que os homens se voltavam mais à atividade, o relacionamento sexual era claramente prejudicado.

Forma de dependência

Mesmo que a pornografia seja prejudicial aos usuários e em alguns casos a seus parceiros, não é consenso que ela cause dependência. Cientistas discutem a adequação do termo para comportamentos compulsivos como jogar, fazer compras, usar a internet, fazer sexo e assistir à pornografia pela internet. Os que definem esses comportamentos como dependência argumentam que algumas ações exageradas compartilham características centrais com a adição de drogas e álcool, que incluem extrema tolerância e uso continuado, apesar dos efeitos negativos que provocam.

Já os opositores contra-atacam dizendo que, embora as pessoas possam praticar certas atividades em excesso com consequências danosas à própria vida, elas raramente desenvolvem tolerância ou sintomas claros caso reduzam a prática (como no caso da droga) – duas marcas registradas da dependência.

Fonte: Scientific American Mente e Cérebro
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